quarta-feira, maio 23, 2007

Sem nome ainda 3

Viro á direita num último impulso e encaixo-me no vazio na estrada do Algarve. Lisboa para lá de tudo.Para lá da desgraça hipócrita dos dias em que nos vamos organizadamente consumindo. E as perguntas surgem sempre iguais vindas do fundo do emaranhado e já gasto pensar, tão gasto. Quero estar sereno, queria dias serenos ! Mas é mais do que as minhas forças que este grisalho de meio de vida me pode permitir.
Faz muitos anos, numa tarde de fogo junto à mesquita de Cordoba uma cigana agarrou-me pelo pulso e olhando.me nos olhos tremeu como o vento. E eu senti o seu arrepio. E perguntei assustado o que era ? como se a resposta não fosse já minha, como se eu não a soubesse sempre no arrasto da dor.
Senhor cuide-se muito. Nunca será feliz nesta vida !
Nesta vida. Noutras vidas. Eu sei-o do fundo de tudo o que vamos guardando nas gavetas dos séculos.
Eu sempre o soube, mas assim. Seca e incivisa como uma cirugia a frio. Faz-nos desvanecer, ficar do tamanho de um grão de mostarda, enfiar-nos no primeiro buraco negro e desaparecer no universo. Mas isso agora não importa.
Sigo para a Sul só. Mas não estou só. Atravessa-me a memória de ti e questiono-me do significado deste breve encontro. Foi à duas horas atrás e parece ter passado uma década ou dez vidas.
E tu dizes-me : num ano muita coisa muda. Um ano ? Que medida miserável é essa de um ano de calendário neste amor rasgado se séculos, em que mudam os rostos, mudam géneros, mudama aqueles de quem nascemos, mudam aqueles que nos fazem a obcessão de outro amor mas não muda este efémero e inevitável cruzar que nos calha vida após vida ! Mas tu sempre assim foste. Começas por sentir para lá do que é possivel sentir; Intensa , apaixonada, quase que feroz, para depois deixares o teu pensar confuso te afogar a memória dos momentos que em mim ficam perpétuos para lá do limite do tempo que me consome no lembrar dos teus olhos intensos, magnificos mas com tanta falta de verdade.
Sempre foi essa a maldição do nosso amor . A tua falta de verdade. O teu gosto por uma vida com truques e cartas de jogo ilegitimas que te vão permitindo ganhar o mundo com batota.
Num jogo viciante mas viciado.

cont.

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